sexta-feira, 6 de março de 2009

irritado (sem motivo aparente)

Acho que tenho um pragmatismo de classe operária. E acho que isso nunca vai me abandonar. Ao observar as pessoas felizes-e-brilhantes da Universidade, fico com uma certa impressão de que sou uma anomalia. A maior parte vive dramas que nem de longe me comovem ou sensibilizam. São problemas que me parecem microscópicos, banais e platônicos. Sim, problemas que habitam um mundo de conjecturas, planos e desdobramentos que tem pouca correlação com as contingências da vida real.

Quase sempre fui um white collar, é verdade. Uns tantos anos no "dinâmico" ramo da informática e mais uns oito trabalhando em um banco. Mas também tive meus momentos chão-de-fábrica. Já soldei, cortei, pintei, montei cercas & portões. Também cortei tecido, separei botões, varri chão de malharia. Confesso: nunca fiz isso para viver - eu quebrava um galho aqui e ali. No entanto, minha família (ou seja, meu blueprint para o mundo) sempre foi - salvo uma curta estadia na classe média - uma família de trabalhadores pouco especializados, mas pragmáticos. Tive uma infância relativamente boa em termos materiais, mas também já tive que comer pão seco e testemunhar minha mãe acordar diariamente às quatro, para "pegar" no primeiro turno.

Sou alfabetizado, formado e deformado pela escola pública. Tive que pagar minha faculdade vendendo uma boa parte dos meus melhores anos. Nunca tive padrinho, mecenas, patrono. Gosto do Bukowski, e me aborreço facilmente com quase tudo que pareça um pouco mais afetado. E assim vou medindo também as pessoas. É um pouco duro, é verdade, e pode ser injusto com alguns. Mas convenhamos: a inteligentzia se esconde em alguma coisa que parece uma torre de marfim, mas que quase sempre parece um castelo de areia. É fácil ser intelectual de buteco, com papai pagando as contas e mamãe lavando as roupas. Os dilemas de uma vida mais mundana são mais contundentes que a filosofia pela filosofia.

Isso não quer dizer que as pessoas não tenham seus méritos, qualidades e peculiaridades. Não significa que tenho um intenso ódio contra a máquina. Sou pragmático, e um pouco insensível com certas sensibilidades. Só isso. Tem dias em que acho que enxergo o mundo através de lentes cinzas, opacas.

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