sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Sobre a música?

Creio que é um processo comum avaliar nossas experiências atuais através de comparações com eventos que vivemos anteriormente. É parte do processo cognitivo, é algo que naturalizamos, é uma maneira para entender o mundo, as coisas que nos acontecem.

Ontem, como uma parte das minhas atividades de adaptação à vida em Campinas e de estudante da UNICAMP, fomos a uma festa de recepção dos calouros de Ciências Humanas e Artes. O estranhamento inicial, óbvio, foi pelo fato da festividade acontecer no campus da Universidade, com música, bebida e tudo mais por ali, em um anfiteatro ao ar livre, aparentemente sem conflitos ou repressão. Não era nenhum Woodstock, mas a liberalidade daquilo tudo faz a FURB parecer um convento; me deu uma sensação fortuita de provincianismo meio deslocada, meio desnecessária. Felizmente, tento manter uma postura meio cética - e talvez até um tanto cínica - em relação às coisas e isso tem me mantido imune ao deslumbramento rápido e rasteiro. Não demorou muito para entender aquilo tudo com uma festa qualquer - uma boa festa, sim - mas nada que fosse, por assim dizer, deslumbrante. Parafraseando o Bukowski: não demorou dez minutos para sacar aqueles calhordas!

Haviam músicos. A primeira banda era um grupo competente, mas nada brilhante, e seu repertório soava com a fusão de um pop rock vagabundo e um remix das músicas do Djavan: pretenciosos e sem originalidade. Daqui a uma semana esqueço deles. O que, digamos, é fato recorrente: tantos músicos talentosos espalhados por aí, mas sem nenhuma noção de oportunismo e originalidade. Nem muito bons, nem muito ruins. Não aprenderam nada com os últimos cinquenta anos de música pop. Mas sempre existem surpresas...

A Heiße Kartoffeln podia ser apenas uma banda punk, com um nome tosco (batata quente?), tocando em pequeno festival chamado River Rock, na pacata cidade de Indaial, lá pelo ano de 1.999. Mas, para mim, aquele foi o maior show da História. Quaisquer tentativas de descrever aquele evento são pífias, meros arremedos. Nunca se viu um caso em que falta de talento, teatralidade, postura punk e agressão física se encaixassem tão perfeitamente. Do começo carregado de discursos e palavras de ordem, passando por execuções frenéticas de hardcore e discussões acaloradas (ou seriam agressões verbais?) entre a banda e o público, culminando com o embate físico entre o vocalista e membros da platéia, aquele foi um evento memorável.

Ontem, na festa, quando algumas televisões e equipamentos eletrônicos foram sendo colocados no palco, fiquei com a impressão de que algo poderia acontecer. Ao menos algo para se prestar alguma atenção. De repente, aquilo que presumi ser um coletivo de DJ's, subiu ao palco, alguns com fantasias pretas e máscaras de filmes de terror antigo, alguns com roupas de médico e máscaras de gás. A música, confesso, estava muito calcada nas novas tendências do gênero eletrônico para chamar minha atenção prontamente, mas o show estava razoável. E então, entrou a genialidade de alguém.

Aguardando em um canto do anfiteatro, durante boa parte da festa, havia um grupo de bateria, batuque ou coisa que o valha. Pareciam meio deslocados ali, naquela profusão de eletronismos. Tampouco pareciam promissores. Havia um quê de desleixo, de despreparo. Com prosaicos chapéus de palha, e camiseta-uniforme de cores berrantes, pareciam estranhamento anacrônicos. Mas quando eles começaram a tocar, ora complementando as batidas eletrônicas dos DJ's, ora tomando para si o ritmo, era como se soltassem faíscas. Alguns engolidores de fogo, surgidos do nada, completavam o quadro. Depois daquilo, a bateria seguiu sozinha por algumas músicas, com competência. Uma banda de covers de sucessos dos anos 80 fechou a noite. Mas ficaram ofuscados. E eu, sonolento.

Não era a Heiße Kartoffeln, mas valeu cada segundo.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Sobre os blogs?

Eu posso fazer disso um veículo para discussão política? Eu devo manifestar apenas opiniões pessoais? Vou redigir um diário auto-indulgente ou discursos sobre polêmicas supostamente interessantes? Para que servem os blogs? Não sei. Não sei mesmo.

Por um lado, penso em uma questão prática: tentar transmitir para os amigos interessados as notícias do que acontece por aqui, em Campinas, na minha nova rotina. Egocêntrico e pretensioso? Talvez. Mas em tempos em que todos recorrem ao Orkut e minha teimosia e idiossincrasias não me proporcionam a paciência necessária para este tipo de "networking" social, acho que encontrei um mecanismo que, se não é válido do ponto de vista da humildade, ao menos é viável.

Conforme a pretensão cresce, surgem novas utilidades: um diário de campo etnográfico, relatando minhas observações sobre a vida do povo do sudeste? Observações sociológicas auto-reflexivas sobre a vida acadêmica? Espaço para meu lado de crítico musical e literário? A inclusão digital possui suas peculiaridades: alçou um bêbado Jeremias ao estrelato e difundiu o acesso à pornografia; proporcionou a realização do ideal enciclopédico renascentista, mas também produziu tanto lixo informacional (blogs, fotologs ou vídeos no Youtube que nunca serão vistos ou lidos) que fico me questionando sobre o absurdo da coisa toda.

Não quero me tornar um fenômeno de milhares de acessos diários. Talvez, afinal, eu me desinteresse rapidamente pela atividade (já aconteceu antes!). Lembrei que no idioma inglês existe a expressão homesick - utilizável para alguém que sente-se triste e saudoso do lar ou da terra natal. Eis um estado de espírito curioso, que pode produzir reações curiosas. Posso estar sofrendo de homesickness ou algum tipo de mecanismo de preservação de identidade pode ter disparado o gatilho do "blogismo" em mim. De qualquer forma, aí está. Bom proveito!